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O fim de uma hegemonia
A guerra da Rússia com a Ucrânia, além de nos por a par das atrocidades que qualquer conflito do gênero nos mostra, para nós, brasileiros, serviu para mostrar uma coisa: o fim da hegemonia jornalística da rede Globo de televisão.
A cobertura feita pela CNN mostrou que de fato ela é a maior do mundo e líder em independência como bem diz seu slogan.
O que víamos antes era apenas a Globo, que supostamente estava em vários lugares com repórteres, ou ligações diretas com correspondentes capazes de trazer informações rápidas sobre qualquer problema onde a notícia existisse. As demais redes não conseguiam sequer se aproximar.
Mas isto chegou ao fim, não que ela, Globo venha tendo uma cobertura ruim do conflito, mesmo porque com a agilidade e a amplitude da CNN, a própria Globo teve que se reciclar. Contudo, vimos que existe coisa melhor do que a programação global, o que antes não sabíamos.
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Isto me lembra uma história. Morei numa cidade interiorana onde o melhor dentista era o Pedro dentista, até que um dia chegou um segundo dentista e aí vimos que o Pedro não era tão bom quanto imaginávamos.
Dizem que até as civilizações são mortais. Assim foi com o Egito, Grécia, Roma e tantas outras, e um dia será com os Estados Unidos da América. Da mesma forma as marcas são mortais. Quem se lembra do Banco Mercantil, ou do Mappin, dos cigarros Continental – a preferência nacional, dos carros DKW e por aí vai.
No mundo da comunicação, ocorre a mesma coisa. A maior rede de comunicações do nosso país foi um dia Os diários Associados, e a rede Tupi de televisão e rádio. Hoje não mais sequer são lembradas, sendo referidas apenas nos livros da história.
A Globo não morrerá por conta deste conflito, poderá até ressurgir e quem sabe renascer para o estrelato. Contudo as notícias que saem na mídia constantemente nos dão conta de os grandes artistas estão indo para outros canais.
As novelas perderam em parte o seu glamour e estão vivendo de reprises com o antigo e desgastado slogan “Vale a pena ver de novo”. Programas de alto custo foram deixados de lado e apresentadores consagrados de grande audiência mudaram de canal e os substitutos não estão à altura dos antigos puxadores de audiência.
Mesmo assim, ela se manteve e vem conseguido no entretenimento pontuar bem. Mas por ora, ela, jornalisticamente, passou para o segundo lugar. Aliás, esta era uma tendência que o jornalismo feito pela CNN antes da guerra já vinha mostrando.
Mas foi no conflito Rússia-Ucrânia que isso se acentuou e ficou patente. Não repórteres falando da guerra na Inglaterra, ou na França, ou Portugal que dista mais de 4mil quilômetros da Ucrânia.
Além do mais, principalmente no início da guerra, o que a Globo nos mostrou firam matérias feitas nos EUA, repetindo apenas manchetes americanas. Isto é, repórteres falando do conflito bem longe dele.
Por conta disso, a Globo teve que contratar repórteres novos e independentes, correspondentes de guerra, que atendem a mais de uma rede de comunicação e estão, no meio das batalhas, coisa que a CNN já vinha fazendo há muito tempo.
Ressalve-se uma matéria – esta sim – muito boa, feita no dia 11, quando a Globo mostrou um combate ao vivo, e de lá para cá tem melhorado um pouco.
A CNN, desde o início, estava e ainda está no meio dos acontecimentos, graças a CNN Internacional, coisa que a Globo não tem. Os correspondentes da CNN, falando com capacetes e ao fundo todos nós vendo o estrondo de bombas, e não só, as reportagens são feitas em meio a agitação de soldados.
Ademais, com os Breaking News, os tais momentos em que algo de relevante ocorre, com o entrevistas e declarações de líderes importantes, tudo nos é mostrado ao vivo nos dando informações em tempos reais.
Por fim, os apresentadores e comentaristas. Não há que se negar a história e o serviço prestado à comunicação brasileira que a Globo possui. Mas na CNN, temos visto um grupo de gente jovem, sem partidarismo (por isso, ela se diz independente) sem os vícios e o ranço de um jornalismo que precisa se reciclar.
A Globo continua sendo um bom canal, mas a hegemonia jornalística se foi, como tem ido muitos de seus bons programas de antigamente. É a crise. Com a CNN, na guerra Rússia-Ucrânia, o espectador está meio do conflito, e serviço prestado redunda em audiência, isto é, escolha de um canal em detrimento de outro. Sinal dos tempos.
Sérgio Motti Trombelli
e professor universitário e palestrante
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